Terminando a minha visita do dia ao Jurado Nacional de Elecciones, fui abordado por uma historiadora e funcionária do Museo Electoral y de la Democracia, de nome Zeila Antonia.
O primeiro aspecto que me chamou a atenção foi o nome do Museu, pois, não apenas conta a história das eleições, como, também, faz questão de contar a história da Democracia no Peru. Nos momentos em que a Democracia do Peru foi atingida por diversos golpes, a história contida no mural do Museu chama o governo de “golpista”.
A história é contada pelos vencedores e, pelo menos enquanto a China não dominar o Mundo, vamos viver sob a doutrina democrática yankee. Contudo, cada país é soberano para contar suas histórias como bem entender, até que um novo vencedor resolva contar de outra forma. No caso do Peru, há um completo repúdio dos atos praticados contra a democracia e aos Direitos Humanos, comprovado nas paredes do Museu e nos livros de história.
Perguntei a historiadora o que aconteceu com os “golpistas” que cometeram atos contra os Direitos Humanos. Prontamente, respondeu – um pouco desconcertada com obviedade da resposta – que todos eles foram punidos. Citou o famoso exemplo do ex-presidente do Peru, Alberto Fujimori (1990-2000), que foi condenado a 25 anos de prisão por violação aos direitos humanos em crimes contra a humanidade e a pagar uma indenização às suas vítimas no valor de US$ 90 mil.
Mas não é só no Peru que os “golpistas” que atentaram contra os Direitos Humanos estão sendo processados e condenados. Na Argentina a Justiça reabriu vários processos, sendo que 263 militares e policiais foram presos ou processados pelos crimes cometidos durante a ditadura. No Chile, o exemplo mais famoso é do ex-presidente Augusto Pinochet, que, oficialmente, deixou 3.197 mortos, entre eles, 1.192 desaparecidos. Apesar de Pinochet ter morrido em 2006, depois de ficar 503 dias em prisão domiciliar, 24 oficiais e suboficiais da polícia política da ditadura foram condenados por crimes de seqüestro, homicídio e tortura de 31 militantes de esquerda e opositores à ditadura.
No Brasil, apesar de muitos anos de Ditadura militar e vários crimes cometidos pelos militares e pelos opositores, optamos por virar a página e esquecer todo o passado de crimes, tortura e desespero. O mais é interessante o fato desta opção é ratificada pela imprensa, judiciário e por nossos próprios governantes, alguns deles vítimas e vilões da Ditadura Militar.
Entendemos que a Lei de Anistia perdoou não apenas os opositores da Ditadura Militar, mas também os membros da própria Ditadura. Nesta guerra, ambos lados praticaram crimes contra os Direitos Humanos e, como “pau que dá em Chico dá em Francisco”, no Brasil não se admite que os “Milicos” sejam julgados e condenados, enquanto os “comunas” fiquem ilesos. Portanto, a Lei de Anistia, na interpretação do STF, perdoou todos os crimes praticados. Assim contaremos nossa história.
Mas contar esta história não será fácil. O Brasil tem sofrido uma forte pressão internacional, inclusive da própria Corte Interamericana de Direitos Humanos, para processar e julgar os Militares por crimes cometidos durante o período ditatorial. Veremos como contaremos esta história.
Penso que não basta ser vencedor para contar uma história, mas também como se vence a batalha. No caso dos nossos hermanos, houve uma completa ruptura com um modelo autoritário: os perdedores foram alijados dos órgãos estatais. No Brasil, nossa transição foi tranqüila e sem muita resistência dos militares. Os ditadores e os filhos da ditadura até hoje ocupam cargos estratégicos no Estado e somente estão deixando o poder porque não contamos a história de homens imortais.
Assim, aos vencedores restam apenas duas opções: esquecer pra viver ou viver pra esquecer.
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